quinta-feira, 21 de agosto de 2008

55ª Assembleia Distrital

“Não fora o Senhor que esteve ao nosso lado, ora diga Israel!”
Uma semana em Mindelo reconfirmou que Deus está agindo nestas ilhas do Atlântico, através do Seu povo nazareno!
Calorosa e de grande nível foi como igreja do Mindelo sob a orientação do seu pastor colega Socorro Fontes e seus colaboradores receberam os amados das ilhas e diáspora.
Bênçãos diárias através da Santa Palavra, comunhão e actividades.
Voltamos animados e dispostos a continuar a servi-Lo.
Um grande abraço e um muito obrigado a Mindelo – São Vicente.
Deus recompensará a todos.
Até Praia, em 2009 se Deus quiser !

-Adérito Silves Ferreira-

Tempo de Loucura

Volta e meia deparamo-nos com situações em tudo previsíveis mas cujo desfecho vem a mostrar-se das mais inimagináveis. É o que me tem acontecido amiúde, em momentos compartilhados com aqueles que deixam de ter, de uma forma efémera ou permanente um comportamento ou um raciocínio que nós outros consideramos normal.

É reconhecido que a complexidade dessas situações faz com que esses momentos também não sejam sempre entendidos por aqueles que como eu têm bebido em fontes semelhantes, certo, mas com água de dissabores diferentes. Estou em crer que não o terão sido pelos que nos precederam.

Aconteceu num desses períodos de campanha eleitoral em que todos, de forma diferente, sem dúvida, apresentam os seus chiliques que na maior parte das vezes escondemos a sete capas mas que o menor dos safanões faz vir à tona, demonstrando, se disso houvesse necessidade o quanto estamos próximos do outro, pelo menos no que diz respeito a essa condição mais ou menos real que é a loucura.

Não posso dizer que estava sintonizado, mas, muito rapidamente pude captar o pequeno deslize do rapaz.

O jovem saiu com aparente tranquilidade e deu um berro em nada inofensivo. Os transeuntes já se tinham ajuntado quando ele se debatia consigo e com todos, inclusive o imaginário. Comentários dos mais diversos foram ouvidos, cada um mais louco que o outro. Nada podia corroborar as várias afirmações que foram proferidas no meio daquela balbúrdia. Até então tido por saudável, pela atitude, pelos gestos e pelo comportamento. Sem dúvida nenhuma dos tais que primam por um estilo de vida saudável.

Um senhor da meia-idade conseguiu milagrosamente que se fizesse algum silêncio e sentenciou: “ Isto é loucura! O pai também teve um problema semelhante quando era jovem. Foi também uma coisa de lua. Era tempo de festa. Melhorou mas ficou sempre de cabeça leve. Ficou com falta de um parafuso.”

Fiquei pasmado e a confusão recomeçava. E, três palavras teimosamente associadas ficaram gravadas na minha mente. A loucura, a lua, o tempo! Tempo de loucura!

- Dr. Daniel Silves Ferreira –

- Psiquiatra -

OS VERBOS DA COMPAIXÃO

Verbos são a espinha dorsal da frase. Exprimem o que se passa, localizam no tempo um acontecimento.
Fala-se hoje muito de vocabulário técnico, uma linguagem específica e privada em que se expressam certos ramos de conhecimento. “Chutar” é próprio do futebol. “Programar”, da nova ciência de computadores. “Frisar” é já da esfera das cabeleireiras, como “refogar” pertence ao mundo dos cozinheiros e “operar” ao dos cirurgiões.
Sentimentos e emoções têm também os seus verbos. Namorar, beijar e casar, relacionam-se ao amor. Agredir, difamar e matar, associam-se ao ódio.
Que verbos exprimem hoje a compaixão? Torna-se importante alistá-los, pois revelam a natureza que atribuímos ao sentimento. Vejamos, então, os mais comuns: lamentar, chorar, suspirar, condenar, criticar, queixar, protestar, lastimar. Todos eles sugerem comportamentos que podem ocorrer no aconchego do lar, longe de fricções e atritos custosos. Podem ser expressos sem que tenhamos de levantar um dedo.
No Evangelho de Lucas, compaixão ganhou outra dinâmica e vem associada a uma lista inédita de verbos de movimento. Há uma avalanche deles na parábola do Bom Samaritano: aproximar da vítima; atar feridas; medicar com azeite e vinho; pôr sobre a cavalgadura; levar para uma estalagem; cuidar do necessitado; dar dinheiro; voltar para pagar o preço total do ministério de socorrer vítimas.
Mais adiante, no capítulo 15, encontramos o pai do filho pródigo conjugando outros verbos da compaixão: correr para abraçar; vestir para agasalhar; comer para alimentar; festejar para exprimir a autenticidade da recepção ao que estava perdido.
Compaixão não vem em frascos de lágrimas inconseqüentes. Tem braços e pernas, comandados por mentes cheias de imaginação e almas transbordantes da dinâmica do amor.
Dr. Jorge de Barros

PERTO DA PASSARELA

A avenida Brasil, na Guanabara, segundo se diz, é a via de aceso de maior movimento na América do Sul. Por ela passam cerca de 150 mil carros por dia. As autoridades colocaram passarelas que vão de um outro lado da via. Assim, os pedestres podem, tranqüilamente, passar por cima delas e alcançar o outro lado sem o menor perigo. Regressávamos da Igreja. Bem no meio da pista um homem estava estendido no chão. Junto dele, um médico e autoridades do trânsito. Estava morto a cinqüenta metros da passarela. Um colega me disse: "Infelizmente isto acontece com frequência." Homens morrem atropelados junto ao caminho seguro.

Vieram à minha mente figuras do passado, tais como o escriba que mereceu palavras elogiosas de Jesus - "Não estás muito longe" O mancebo de qualidade, Judas, Pilatos e outros; embora tão juntos da "passarela", atravessaram a via tumultuosa do pecado, como muitos do presente. Pensei no imperativo de Cristo: "Ide" que seria o mesmo que dizer: "Colocai-vos noas vias do mundo, conclamai bem alto que Cristo estabeleceu a "passarela" segura para o outro lado da vida. O Diabo passa sem freios e terrivelmente continua nos seus atropelos, destruindo lares, decepando reputações, criando órfãos e enterrando nações no caos da miséria espiritual.

Nos campos, nos bairros, nas cidades do mundo há milhões que precisam ouvir que o homem não tem de se deixar mutilar pelo Diabo.

Há urgente necessidade de nos enfileirarmos, do jeito que Jesus deseja, pelas vias e vielas do mundo, num novo conceito de missões, para avisarmos, para apregoarmos, para gritarmos aos homens, aos homens de todas as raças, de todas as tribos, de todas as nações - esses milhões que desconhecem as leis seguras do trânsito da via do céu - que Jesus é : "O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA"

Fernando de Sá Nogueira

sábado, 2 de agosto de 2008

BODAS DE PRATA

30/07/1983 - 30/07/2008
Parabéns e muitas felicidades



Betinho Di Nha Nanay

Há dias, vi a fotografia da Ponte velha de Vila-Nova, num dia chuvoso, quando as águas passavam por baixo a caminho da Praia Negra. Senti saudades daquela ponte que foi inaugurada no ano em que nasci e onde centenas de vezes, assentei-me juntamente com amigos de infância para aquela “cavaqueira” que nunca terminava. Dizem os mais velhos que numa das fotografias da referida ponte, eu apareço na janela da casa da minha avó, que distava poucos metros. As saudades aumentaram. Saudades da terra. Saudades de Vila-Nova onde nasci e cresci. Saudades dos meus familiares. Saudades de amigos, de colegas, condiscípulos de escola e do próprio ambiente. Lembrei-me de algumas “historietas” da minha infância. e prometi a mim mesmo voltar ao meu “mundinho” logo que possível.
Envolto nestes pensamentos nostálgicos, repentinamente me veio à mente a imagem de um colega que por mais de trinta anos não me lembrava e não creio ter falado dele com ninguém. Não senti medo como naquela noite da sua partida.
Tinha ele onze (11) anos e eu menos três ou quatro. Colegas da escola primária (quando ele ia, pois não gostava muito) mas mais ainda do terreiro do futebol que nós os dois gostávamos em demasia.
Nunca reparara nele algum sinal de doença; não sei se pela tenra idade minha ou então porque simplesmente tudo aconteceu de repente.
O que me lembro e bem, é que passava muito mais tempo a jogar a bola do que a fazer qualquer outra coisa, incluindo a frequência às classes.
Eu, na minha hora de brincadeira, ajuntava-me a ele e a demais colegas e jogávamos. Ele muito mais robusto e eu com um pouco mais de técnica para a prática do futebol. Ele gostava que eu fizesse parte da sua equipa. De vez em quando éramos rivais no campo, mas nunca houve briga entre nós, coisa tão normal daquele tempo que já não volta mais.
Numa tarde quente, normal na minha terra Santiago, e mais propriamente no meu querido bairro Vila-Nova, tudo mudou quando chegou aos ouvidos de toda a meninada que Betinho di Nha Nanay ou melhor Lobo, tinha sido internado no hospital da Praia com febre alta e com sinais de hepatite.
Na manhã seguinte, a notícia foi mais trágica – Lobo dja morri – Lobo morreu. Não recordo como foi a minha reacção naquele dia/momento. Só sei que não houve classe naquele dia, pois ele morava a poucos metros da nossa escola. Neste aspecto (katém skola) talvez tenha ficado “contente” e possivelmente toda a camaradagem também.
A azáfama foi grande quando o corpo do Lobo chegou à casa para a última despedida. Os pais dele, não os vi, e nunca soube quem eram. Lobo vivia com Nha Nanay, presumível avó, que nós a garotada não gostávamos pois sempre que a bola chegava à sua porta, significava automaticamente fim do jogo. Naquele dia, ninguém deu importância à bola, e nem lembramos que Nha Nanay tinha fama de feiticeira.
A invasão à casinha onde apenas ela e o Lobo moravam, foi grande. Não havia lugar para todos. Houve até disputa de quem transportava o caixão. Naquele tempo, o esquife era normalmente levado à mão pelos colegas do defunto até a última morada – Cemitério da Várzea.
Depois daquele dia, como referi acima, por incrível que pareça, nunca mais lembrei-me do Betinho - Lobo e, nem tão pouco falei dele com quem quer que seja.
Trinta e tal anos depois, me veio à mente que o enterro do Lobo foi o primeiro cortejo fúnebre que acompanhei. Lobo realmente teve vida curta. Onze anos apenas. Perguntei a mim mesmo: Será destino? Não sei. Se sim, então a conclusão é que é impossível a quem quer que seja fugir do seu próprio destino.

Delfin Andrade Silves Ferreira

Porto da Praia

Obras de expansão em breve!

AS VIÚVAS GREGAS E O CRESCIMENTO DA IGREJA

Naquele ano a Igreja do Nazareno ganhou todos os prêmios do Distrito de Jerusalém. O relatório achado no livro de Atos diz que “todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar”(2:4). As estatísticas explodiam. Em vez da palavra congregação que nos é peculiar, achamos outra mais ajustada aos números crescentes: multidão (6:2). Ela traz-nos a imagem duma torrente que surge inesperadamente e até ameaça romper os diques duma previsão ultraconservadora.
Estudantes da disciplina do Crescimento da Igreja penetram este cenário como se entrassem num laboratório à procura da descoberta que decifrará o código genético dum fenômeno tão cobiçado. Por vezes emergem dos seus estudos com um brilho nos olhos e um entusiasmo contagioso. Em outros instantes, porém, surgem de chicote em punho, prontos a fustigar a igreja de hoje por não ser igual à de ontem e, por isso, achar-se emperrada, lutando penosamente por crescimento anual de um dígito apenas.
Certo, temos uma obsessão por números. A coisa é tão antiga como o Livro Sagrado. Assim, é fácil sabermos quantas ovelhas e vacas possuía esta ou aquela personagem bíblica, quantos peixes tinha a rede dum pescador, quanto dinheiro valia o perfume duma penitente. Uma nova técnica já acessível ao consumidor é a chamada gravação digital. Em vez dos impulsos mecânicos e magnéticos com que se produziram ontem discos e fitas, o método revolucionário reduz a dígitos as notas de qualquer instrumento. A descodificação final deste processo numérico produz uma riqueza de sons em que se eliminam problemas de distorção e de ruído em escala jamais obtida. E assim continua o nosso fascínio com o mundo dos números!
Será por isso que entramos de calculadora na mão na arena do crescimento da igreja? Por anos pastoreei uma igreja cuja assistência encabeçava as estatísticas do distrito. Era fácil cair na tentação de nos considerarmos “a maior igreja evangélica do país”. Mas nunca me esquecerei do espetáculo acabrunhador que nos oferecia o cinema vizinho onde milhares se acotovelavam para entrar, à mesma hora em que as nossas centenas vinham em pingos para o culto de Domingo à noite. Como que a deitar um pouco de sal à ferida, alguém lembrou ao pastor: “E eles pagam bilhete...”
Em tais ocasiões, vamos de tropel ao cenário de Atos dos Apóstolos, investigamos igrejas crescentes, lemos de supercongregações na Coréia e em outros pontos do mundo e perguntamos: Por que não aqui? Obcecados pelos gráficos, saltitamos de Domingo a Domingo nessa aritmética engenhosa de “contar pés em vez de cabeças”, num esforço de promover o “crescimento” da igreja.
Mas precisamos de mais do que números para o alcance deste alvo. Duvido mesmo que o elemento numérico seja prioritário na avaliação da igreja saudável. Por seis anos fui capelão da cadeia civil da minha cidade. Sempre me entristeceu qualquer aumento de assistência ali... Os números serão um dos sintomas duma igreja saudável, mas não prova disso. Há restrições de ordem geográfica, social e econômica que impedirão a certas igrejas um crescimento espetacular em termos de membros ou de receita. Mas nem por isso elas deixarão de ser estrelas brilhantes nas trevas deste mundo.
Seria interessante convidarmos as viúvas gregas da igreja de Jerusalém, mencionadas em Atos 6, a apresentar o relatório anual da congregação, em lugar dos titulares oficiais do cargo. Enquanto pastores teriam a tentação de exaltar o crescimento numérico explosivo, as viúvas apresentariam um ângulo por vezes negligenciado na corrida dos números. A igreja crescente não sacrifica no altar das estatísticas a sua identidade e missão. Enquanto ela se expande par abraçar o mundo, cuida também dos seus membros mais humildes, em todas as áreas do viver quotidiano; enquanto reflete e protege a sua memória histórica e regional, ela se universaliza numa vigilância contínua, alerta à discriminação de qualquer espécie; enquanto enfileira números em gráficos impressionantes, ela vai distribuindo pão em atos compassivos nos quais há mais sigilo e menos câmaras fotográficas.

- Dr. Jorge de Barros -

Tempo de Loucura

Crianças, andávamos em verdadeiro reboliço por causa do período de festas que se vivia. Em grupo, preparávamos tranquilamente os nossos “instrumentos” preciosos para a cata de alguns tostões logo depois do pôr do sol. As pessoas deveriam ser generosas.
Dos camiões vindos do interior desembarcavam homens, mulheres, famílias inteiras para as festas do fim do ano.
Chegavam notícias estranhas, macabras, de localidades não muito distantes e dos subúrbios da cidade. Homens esfaqueados em brigas fúteis, a nova arma daquela mulher que aproveitara o sono do companheiro para lhe derramar gordura de porco fervente no ouvido, de modo a derreter-lhe os miolos, homens embriagados gritando nas ruas, e já na vizinhança as crises incompreensíveis da jovem donzela que, se dizia, estar possuída de espíritos do outro mundo.
No portal da casa, o velho, apontando a muleta, que sempre lhe conhecemos, para o interior, anunciava o fim do mundo para aqueles dias.
No seu dizer, o fim dos tempos, só dependia dele, mas as constantes advertências não pareciam merecer a curiosidade dos transeuntes.
Dizia que os tempos estavam atribulados, estávamos todos perdidos e, pior, ninguém poderia saber o paradeiro dos seus quando tudo acontecesse.
Então, nada melhor do que ter um sinal facilmente identificável, garantia de um reencontro com os parentes no mundo prestes a chegar.
A advertência agora mais ameaçadora, fez-nos temer o nosso futuro.
Apesar da perna amputada e, (talvez) por causa das suas muletas, as palavras dele eram autoridade para nós.
Repetindo energicamente o nome da velha imobilizada na cama desde que partira os ossos da coxa acima, deu dois passos em frente e dois à esquerda. Estava na presença da anciã. Segurou o lóbulo de uma das orelhas, tirou uma faca afiada da algibeira e agora com alguma pausa martelava:
- Fu-la-na, Fulana de Beltrana. É preciso que te ponha um sinal na orelha para que saibam que és Fu-la-na, Fulana de Beltrana.
A voz roufenha da velha fez-se ouvir e valeu a presteza de um neto, então no serviço militar, que não nos apercebemos como lá apareceu.
O velho, outrora tão simpático, foi então levado para onde não sabíamos, aos berros acerca dos sinais, do fim dos tempos. Tempo de loucura!
- Daniel Silves Ferreira –
- Psiquiatra -