sábado, 2 de agosto de 2008

AS VIÚVAS GREGAS E O CRESCIMENTO DA IGREJA

Naquele ano a Igreja do Nazareno ganhou todos os prêmios do Distrito de Jerusalém. O relatório achado no livro de Atos diz que “todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar”(2:4). As estatísticas explodiam. Em vez da palavra congregação que nos é peculiar, achamos outra mais ajustada aos números crescentes: multidão (6:2). Ela traz-nos a imagem duma torrente que surge inesperadamente e até ameaça romper os diques duma previsão ultraconservadora.
Estudantes da disciplina do Crescimento da Igreja penetram este cenário como se entrassem num laboratório à procura da descoberta que decifrará o código genético dum fenômeno tão cobiçado. Por vezes emergem dos seus estudos com um brilho nos olhos e um entusiasmo contagioso. Em outros instantes, porém, surgem de chicote em punho, prontos a fustigar a igreja de hoje por não ser igual à de ontem e, por isso, achar-se emperrada, lutando penosamente por crescimento anual de um dígito apenas.
Certo, temos uma obsessão por números. A coisa é tão antiga como o Livro Sagrado. Assim, é fácil sabermos quantas ovelhas e vacas possuía esta ou aquela personagem bíblica, quantos peixes tinha a rede dum pescador, quanto dinheiro valia o perfume duma penitente. Uma nova técnica já acessível ao consumidor é a chamada gravação digital. Em vez dos impulsos mecânicos e magnéticos com que se produziram ontem discos e fitas, o método revolucionário reduz a dígitos as notas de qualquer instrumento. A descodificação final deste processo numérico produz uma riqueza de sons em que se eliminam problemas de distorção e de ruído em escala jamais obtida. E assim continua o nosso fascínio com o mundo dos números!
Será por isso que entramos de calculadora na mão na arena do crescimento da igreja? Por anos pastoreei uma igreja cuja assistência encabeçava as estatísticas do distrito. Era fácil cair na tentação de nos considerarmos “a maior igreja evangélica do país”. Mas nunca me esquecerei do espetáculo acabrunhador que nos oferecia o cinema vizinho onde milhares se acotovelavam para entrar, à mesma hora em que as nossas centenas vinham em pingos para o culto de Domingo à noite. Como que a deitar um pouco de sal à ferida, alguém lembrou ao pastor: “E eles pagam bilhete...”
Em tais ocasiões, vamos de tropel ao cenário de Atos dos Apóstolos, investigamos igrejas crescentes, lemos de supercongregações na Coréia e em outros pontos do mundo e perguntamos: Por que não aqui? Obcecados pelos gráficos, saltitamos de Domingo a Domingo nessa aritmética engenhosa de “contar pés em vez de cabeças”, num esforço de promover o “crescimento” da igreja.
Mas precisamos de mais do que números para o alcance deste alvo. Duvido mesmo que o elemento numérico seja prioritário na avaliação da igreja saudável. Por seis anos fui capelão da cadeia civil da minha cidade. Sempre me entristeceu qualquer aumento de assistência ali... Os números serão um dos sintomas duma igreja saudável, mas não prova disso. Há restrições de ordem geográfica, social e econômica que impedirão a certas igrejas um crescimento espetacular em termos de membros ou de receita. Mas nem por isso elas deixarão de ser estrelas brilhantes nas trevas deste mundo.
Seria interessante convidarmos as viúvas gregas da igreja de Jerusalém, mencionadas em Atos 6, a apresentar o relatório anual da congregação, em lugar dos titulares oficiais do cargo. Enquanto pastores teriam a tentação de exaltar o crescimento numérico explosivo, as viúvas apresentariam um ângulo por vezes negligenciado na corrida dos números. A igreja crescente não sacrifica no altar das estatísticas a sua identidade e missão. Enquanto ela se expande par abraçar o mundo, cuida também dos seus membros mais humildes, em todas as áreas do viver quotidiano; enquanto reflete e protege a sua memória histórica e regional, ela se universaliza numa vigilância contínua, alerta à discriminação de qualquer espécie; enquanto enfileira números em gráficos impressionantes, ela vai distribuindo pão em atos compassivos nos quais há mais sigilo e menos câmaras fotográficas.

- Dr. Jorge de Barros -