domingo, 27 de abril de 2008

DEIXO-VOS A MINHA PAZ














Tens mesmo “boka bedju! Era assim que classificávamos alguém que, sem argumentos convincentes, discutia a ponto de aproximar-se da pura teimosia!Hoje em S. Tiago, minha ilha, e na Praia, minha Cidade querida, a expressão é conotada com violência. Desde logo porque “boka bedju” é uma arma de fogo de fabrico artesanal, mas, que, lamentavelmente, tem causado vítimas mortais e muita tristeza, para além de trabalho árduo às autoridades. E são preocupantes os relatos sistemáticos de violência inter-bairros e, particularmente, com a camada juvenil.Definitivamente não era assim no passado! As querelas de então eram quase sempre à volta das equipas das zonas, quais sejam, Santos, Espanha, Braga, Portugal, Holanda, Coreia, Israel, Uruguai, Argentina e Chile! Coisas passageiras e que não deixavam ódio nem espírito de desforra ou vingança!Eu creio firmemente na prevenção familiar, escolar e policial mas tenho por mim que solução real só virá quando nossa juventude e todos nós buscarmos a Paz de Jesus Cristo! ELE não podia ser mais claro: “Deixo-vos a Minha Paz, a minha Paz vos dou; não vo-la dou como o mundo a dá.”A Cidade reclama por pacificadores em todas as zonas. Gente conhecida e respeitada pelo ser e estar, disponível para uma acção preventiva, o quanto antes.Da nossa parte, disponibilizamo-nos para organizar um Dia de Reflexão à volta da problemática, com representantes dos bairros e das autoridades. Contudo, fico orando e à espera de ver meus “irmãos da Cidade” na posse da Sua Paz.Então, nossas crianças virão às praças, de bicicletas, nossos idosos farão seus passeios vespertinos e nossos jovens, de mãos dadas, farão das “avenidas” lugares de sonhos positivos!“A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo, seja com todos vós.” Amén. Pastor Adérito Silves Ferreira

PRAIA NEGRA



Rastador, Pedra Fernando, Banhera e Mesa - Ai tempo que não volta mais!

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Tempo de Loucura




Como acontecia duas vezes por semana, ele chegou, pontual, para mais uma sessão de cinquenta minutos, da qual sempre se queixava.
Deu-me um aperto de mão, sentou-se e, de imediato começou a falar.
Eram, quase sempre frases soltas, dita em tom de récita, que ele afirmava que eu podia entender. Aliás, nos momentos de grande resistência dizia sempre que eu conhecia a vida dele “de trás para a frente e de frente para trás”.
Era coisa de louco! Não tinha como tirar aquelas ideias da cabeça! Três medos absurdos que não resistem a qualquer lógica e que infernizavam a vida dele. Definiu-os em poucas palavras e esboçou uma crítica.
Não há dúvida que a mente é complexa e poderosa, mas, há coisas que só acontecem aos menos fortes. Bem vistas as coisas, não era tão fraco assim! Porém, a sua história e a associação livre facilmente permitiam entender o que ele queria dizer.
Continuava falando como tinha começado e eu, quedo, lá ía escutando. Uma vida de loucura! Uma vida girando à volta do medo, de três medos!
Notei que ele queria fugir daquele passado tão próximo quando se pôs a divagar. Mas, sorrateiramente lá ia ele de novo ao que lhe vinha espontaneamente à mente.
Repetiu sumariamente as circunstâncias em que os sintomas se manifestaram, o percurso feito até chegar ao atendimento.
Então, fez uma pausa e mudando bruscamente de tom, atacou: É tudo muito louco! Vir aqui e estar a falar de tudo e de nada, despir-se, mostrar toda nudez, escutar colocações loucas de um modelo também louco, achar que é tudo uma loucura… não deixar de vir.
Sorriu e algo conciliador, como que procurando gratificação, rematou: Louco, mas está funcionando.
Um pouco sem jeito, ele rodou o pulso que não tinha relógio e disse-me: são horas! Calmamente, olhei para o meu e confirmei com um simples movimento da cabeça.
Levantou-se, estendeu-me a mão e, enrubescido, saiu sem ter uma resposta que não desejava nem eu podia dar. Tinha acabado o nosso tempo. Tempo de Loucura!
- Dr. Daniel Silves Ferreira –
Psiquiatra

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Escola Grande da Praia


Lembrança dos Exames da 4ª classe e de " Nha Iria "

quinta-feira, 17 de abril de 2008

VOAR








Há 30 anos chegava ao aeroporto da Praia, ainda adolescente, para aprender electricidade, e um pouco mais tarde, instrumentos de aviões.
Como meu mundo tinha mudado desde aquele dia de Junho, dos anos 70 do século passado! Do menino da Vila Nova, que via aviões ao longe e ouvia histórias exageradas de adultos, acerca desses “bichos do ar”...

Agora, estava perto e percorria seus espaços atraentes e misteriosos!
Me interessei pelos objectos da minha aprendizagem, mas, o que eu queria mesmo, era ter oportunidades de VOAR.
Felizmente, surgiram vezes sem conta esses momentos, quando nós, transformados em “lastro”, embarcávamos para os voos de ensaio ou de experiência.
Lá do alto, com meus olhos fundos, mas, “grilidos” sempre, via as casas, a imensidão do mar, as nuvens, o sol, os montes, carros e até pessoas, quais pontinhos em movimento…

Anos depois, recebo do Senhor o desafio de continuar a VOAR, voos altos e com visão de Águia.

O apóstolo Paulo se dirigindo aos Colossenses disse: “ Portanto, se fostes ressuscitados com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus”.

Como custa a muitos de nós esta obediência! Insistimos em não VOAR, detendo-nos em dimensões terrenas, humanas e limitadas!

Isaías deixa-nos esta certeza: “ mas, os que esperam no Senhor, renovarão as suas forças. Subirão com asas como águias; correrão e não se cansarão, caminharão e não se fatigarão”.
Precisamos para os dias de hoje, jovens, adultos e obreiros com visão de Águia! Temos desafios que “codornizes e perdizes” não alcançam! Só águias, motivadas e dispostas a VOAR, podem!

Ganhar para Cristo, teus familiares, colegas e amigos – tua aldeia, vila e cidade – país e mundo, são tarefas para Águias! ELE nos convoca!

“A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo, sejam com todos vós.” Amém.

-Pastor Adérito Silves Ferreira -

TEMPO DE LOUCURA


Por um instante acreditei que o amigo tinha ficado subitamente louco. Não podia pensar de outra forma quando nada levava a prever tão brusca paragem. A velocidade e a potência dos freios levaram a uma rápida derrapagem, seguida de uma imobilização do pequeno automóvel. Minha fronte foi esbater-se no pára brisas com violência.
Mal o engenho ficou imobilizado, meu amigo estava já fora do automóvel, e a passos rápidos atravessou a estrada. Dirigiu-se para a berma onde estava um homem magro, sem idade, sentado, com a cabeça entre as pernas entreabertas e cruzadas.
Tinha um pequeno galho de árvore na mão e talvez estivesse rabiscando algo.
Não tinha ainda percebido o ocorrido e o meu companheiro já tinha voltado. Quis saber de imediato a razão por que quase ia ficar machucado!
Com uma melancolia indisfarçada disse-me que para aquele homem, enrodilhado em si e nos seus pensamentos, aquela simples saudação poderia ter algum valor. Talvez fosse a única satisfação na vida.
Bem que ele tinha tentado, por palavras e gestos mas jamais tinha sido possível retirar-lhe qualquer resposta.
Todas as manhãs, via o homem na escada que dava acesso à igreja. Sempre sisudo, apenas respondia ao “bonjour, monsieur” e, ficava por aí.
Na cidade, nunca dirigia ou respondia a palavra a quem quer que fosse. Parecia viver noutro lugar, noutro mundo.
Retomámos o nosso destino rumo à praia que, ainda, ostentava o nome de uma heroína francesa.
A temperatura do ar, aquecida pelo asfalto em fusão, pelas chamas das florestas sobranceiras à cidade e pela proximidade de refinarias e usinas petroquímicas já não me incomodavam. Meu pensamento ia para aquele homem cuja vida necessitava de apenas um gesto e de apenas uma pessoa.
Certa vez, cheguei mesmo a confessar que este episódio, não sendo decerto determinante, não teria deixado de contribuir para o meu futuro de contacto próximo com a loucura.
Pergunto-me ainda com certa frequência porque teria eu guardado na mente um facto que o tempo tende sempre a tornar inocente! Sobretudo quando meu amigo deixou de fazer parte dos nossos e o pobre homem nunca poderia saber, o quanto ficámos ligados na loucura e na vida. Tempo de loucura!

Dr. Daniel Silves Ferreira

-Psiquiatra-

quarta-feira, 2 de abril de 2008




Ai......, a nossa Prainha!!! Quantas saudades! Tempos Bons!

Semana Especial da Juventude da Praia



Participação especial do Saxofonista Hilquias Alves, da igreja Central de Campinas.


















O Evangelista será o Pastor Fernando Souza, de Fortaleza
o6 a 13 de Abril

Quo vadis Profetas!



Há indicações ali e aqui de uma sempre deficiente distribuição de riquezas!

Países se batem e conseguem o equilíbrio macro-económico, reduzindo nos gastos públicos e no já estafado cumprimento rigoroso do orçamento!

O simples cidadão nem sempre entende essas coisas, e talvez nem tenha, com razão, interesse por elas.

Quer o povo, e a classe desfavorecida, mais habitação, melhoria na saúde e educação, segurança, e quem sabe, a própria democracia!

Temos no mundo, e no nosso em particular, e apesar de esforços de décadas, carências do básico, e o pouco existente chamado de riqueza, fica nas mãos de uma minoria que por vezes se torna insensível.

É hora de gritar por aquela voz profética, que destoa, não encontra simpatias, “aborrece”, e está aí na Comunidade – que é a Igreja, para se apresentar quanto antes, pois o tempo urge!

Tenho por mim ser chegada a hora de apresentarmos à nossa sociedade, uma nova proposta, que comece com a mensagem: “ama teu próximo como a ti mesmo…” “dai-lhes vós de comer…” e “ jamais despede a multidão vazia…”

Considere comigo esta Palavra, em Amós: “ Portanto, visto que pisais o pobre, e dele exigis tributo de trigo, edificareis casas de pedras lavradas, mas, nelas não habitareis, vinhas desejáveis plantareis, mas, não bebereis do seu vinho”.

“ A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós.” Amem.


- Pastor Adérito Silves Ferreira -

Tempo de LoucuRa

Era de todos conhecido. Temido de muitos. Evitado por uns tantos. Sabia-se que nos anos cinquenta, ele tinha morto acidentalmente um jovem estudante em férias na sua ilha natal.
Não, a motorizada não era sua! A resposta negativa enfureceu-o e, então atirou uma pedrada certeira quando o rapaz já estava em marcha. Atingido na cabeça, o jovem caiu e, pelo que se contava, morto.
Tratava-se de um homicídio acidental que todos fingiam desconhecer. A revolta era tanta que mesmo um familiar com fama de bom magistrado teria sucumbido ao mesmo erro. Contudo, prevaleceu o inevitável: transferência para a quinta do hospital de Santa Isabel na Praia, onde iria passar os trinta anos seguintes.
Conhecí-o nos tempos da minha meninice e, de certa forma, tivemos alguma convivência na casa onde, por ironia da sorte, viria a morar cerca de vinte e cinco anos depois.
Quando ele conseguia fugir do “pavilhão” – assim também era conhecida a quinta enfermaria - dava um pulo até o meu bairro onde conhecia gente da ilha dele.

A cobertura de colmo da casa onde costumava ficar foi removida e iria ser substituída por telha Marselha. Muitas vezes ele lá dormia em cima das telhas empilhadas usando sacos como lençol e cobertor.
Com um lápis de carpinteiro, escrevia frases sem sentido, nas paredes de casa feita pardieiro. As letras grossas e de contornos arredondados que ele deixava inscritas eram de uma grande beleza para mim, menino apenas iniciado à leitura e à escrita.
De manhãzinha, lá estava ele, de vassoura de folhas de tamareira na mão, varrendo a rua e cantarolando sem parar. Ali mesmo tomava a grandes goles o café que a minha avó lhe oferecia numa caneca de folha-de-flandres que então existia em quase todas as casas.
Eu, meu irmão mais velho e mais alguma criançada estávamos quase sempre por perto. Sabíamos a história que ele nunca deu mostras de se lembrar. Mas quanto a mim, estranhamente, nunca tive medo dele. A sua loucura tinha até causado uma certa admiração minha por ele.
Há uns anos atrás, estando na ilha dele, não pude deixar de ir vê-lo na sua própria aldeia. Mandei chamá-lo e não tardou aparecer, alegre, marcha rápida, postura aprumada, cabelos e barbas brancas, bermudas de caqui americana. Disse-me como se me (re) conhecesse: Então, Eduardo! Esta pasta é minha! Pediu-me um cigarro, despediu-se e foi-se embora.
Nunca mais soube dele mas, quantas vezes, naquela casa onde o conheci e vim a morar, não pensei nele e naqueles dias. Tempo de Loucura!

-Dr. Daniel Silves Ferreira-
Psiquiatra